sábado, 18 de setembro de 2010

VPV e Salazar

A 5/09 publicou Vasco Pulido Valente um acertado comentário à biografia de Salazar que hoje por hoje por aí tanto está a vender.
Acho o seu texto tão pertinente que, socorrendo de alguma pesquiza e contornando assim as travas habituais do jornal Público, aqui vai um bom excerto:

"Saiu finalmente uma biografia de Salazar (a de Franco Nogueira era almanaque hagiográfico sem sentido ou valor). A biografia é de Filipe Ribeiro de Menezes, doutorado em Dublin e professor de uma universidade irlandesa. (…) vale a pena ler esta longa e minuciosa história do homem que governou, sem sombra nem rival, gerações sobre gerações de portugueses e conseguiu criar uma cultura política que hoje ainda pesa - e pesa muito - na democracia que temos.

Para quem viveu sob Salazar – e já deve haver pouca gente –, o que falta nesta biografia é, naturalmente, a atmosfera do regime. Porque não existia uma ditadura, existiam milhares. Cada um de nós sofria sob o seu tirano, ou colecção de tiranos, na maior impotência. A família, a escola, a universidade, o trabalho produziam automaticamente os seus pequenos "salazares", que, como o outro, exerciam um autoridade arbitrária e definitiva que ninguém se atrevia a questionar. A deferência – se não o respeito – por quem mandava era universal; e essa educação na humildade (e muitas vezes no vexame) fazia um povo obediente, curvado, obsequioso, que se continua a ver por aí na sua vidinha, aplaudindo e louvando os poderes do dia e sempre partidário da "mão forte" que "mete a canalha na ordem".
Só num ponto, essencial, Salazar perdeu. Queria um país resignado à pobreza cristã e Portugal, se continua pobre, não se resigna agora à pobreza com facilidade e abandonou a Igreja. (…) E o mundo moderno desorganizou o Portugal manso e miserável que ele com tanta devoção construíra. O preço que pagámos pela ditadura desse provinciano mesquinho é incalculável."

No momento em que medra algum revisionismo histórico sobre o antes do 25 de Abril - o que não é difícil quando do outro lado só há Fernando Rosas... - este texto é bem mais do que um mero tónico capilar. Quantos de nós não vivemos no emprego coisas que lembram isto, cuja raíz digamos genética, está nisto? Em Portugal ainda há os ditadorzinhos de pacotilha, os do quero posso e mando, os bufos da corte e os bobos da mesma, os marginados e os marginais e o pior neste mundo português sempre foi o ser apontado a dedo.
Ainda nos perguntamos porque o cinzento dos carros, das roupas e das caras?

 

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