sábado, 10 de abril de 2010

BENTO IRÁ A S.BENTO?



Bento irá a S. Bento. Disso e de outras histórias se falará, mais tarde, só para dizer o quanto mais caro que o previsto, ficou o obséquio hospitaleiro dos lusitanos. E comentar-se-á da excentricidade filantropa dos políticos que – e disso também se falará mais tarde – buscarão protagonismos circunstanciais e bolorentos nas páginas noticiosas e paroquiais de somenos publicações. Uns contra, outros a favor. De quê, afinal?

Bento irá a S. Bento. Irá? Ou a preferência da visita ficará pelas catacumbas de uma fé pouco abrilhantada por definições improváveis de um catecismo (teimosamente o mesmo) de milénios?

Bento irá a alguns dos lugares que o protocolo, explicitamente, designa, como “vaticanamente” correctos: as vias populares de cristianismo ancestral, onde abundam as não-perguntas, as não-questões e os não-problemas e onde as coisas são sempre como são e como já o eram antes de o serem. Ámen.
Bento irá aos sítios onde a venda de santinhos, de terços e de relíquias, assume proporções de idolatria ordinária que frutifica por toda a espécie de “crentes”.

Bento o que dirá, para além do que não diz?

Espera-se sempre que outro próximo fumo branco ganhe capacidades de diálogo e de transparência, mas seria importante desmistificar o poderio silencioso que o chefe da Igreja consegue manter. Tão afastado das inquietações crescentes de algumas pessoas que, sendo cristãos, vivem tempos de indiferença, perante uma liderança distante, egocêntrica e, analfabetamente, alheia aos tempos modernos.

Imposição em vez de ajuda. Silêncio em vez de respostas. Claustros em vez de sol.

Bento irá a S. Bento? Não sei, mas deveria ir. Seria um exercício gratificante, bilateral e único. Depois poderia apanhar o metro e ouvir as queixas, andar de autocarro e ouvir as queixas, andar pelas ruas e ouvir as queixas, visitar o Parlamento e ouvir as queixas. E, se tivesse tempo, “who knows” (?), assistir a uma tourada.

A seguir, o incontornável comboio para o Porto e ouvir as queixas, andar pelas ruas e ouvir as queixas, o metro outra vez e ouvir as queixas, o autocarro outra vez e ouvir as queixas e o Bolhão e ouvir as queixas. As gentes e as queixas.
Queixas que às vezes só se ouvem com a alma preparada.
Há uma multidão de gentes vulgares com uma angústia tornada vulgar. “Meu Deus!, dizem alguns.”

Afinal onde está o teu Deus, Bento?

Nelson Ferraz in “Maia Hoje”, 09.04.2010

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